A relação entre língua nativa e o modo de ver o mundo

Um dos aspectos mais interessantes de aprender uma língua estrangeira é justamente perceber como uma determinada frase é expressa em outro idioma, pois através desse processo podemos compreender o modo de pensar daquele povo, já que língua e cultura estão intrinsecamente ligados.

Como a linguagem é nossa principal forma de comunicação, ela também condiciona nossa visão do mundo, podendo influenciar até mesmo nosso modo de viver.

O economista comportamental Keith Chen, da Universidade de Los Angeles, descobriu que os chineses, por não terem na sua língua um tempo verbal preciso para indicar o futuro, são 30% mais propensos a economizar do que falantes de outros idiomas que exigem uma distinção clara de tempo.

Segundo sua teoria, nas línguas nas quais é possível expressar linguisticamente o futuro de forma distinta do presente, como o inglês e o português, o futuro parece muito distante, e isso de alguma forma leva a pensar menos no futuro e, consequentemente, a economizar menos. Entretanto, se o futuro e o presente não estão distintos na linguagem, é mais fácil economizar. Ainda segundo o resultado de sua pesquisa, não ter um tempo futuro na gramática influi até no índice de fumadores ou de obesidade, pois como o futuro parece menos distante, pensa-se com mais seriedade nas consequências do que se faz. Veja o vídeo de sua apresentação na Ted Talk aqui.

Um bom exemplo de como a língua influencia o modo de pensar são os pirarrãs, um povo indígena brasileiro que vive na Amazônia. Eles não conseguem quantificar com exatidão as coisas, pois seu sistema numérico vai apenas até o número 3. Após essa quantidade, tudo é ou “muito” ou “pouco”. Imaginem o problema na hora de aprender matemática.

Isso explica porque algumas palavras são intraduzíveis em outros idiomas, levando os tradutores a um verdadeiro contorcionismo linguístico. Um exemplo clássico é a palavra “saudade” em português, que em inglês pode assumir diversas formas dependendo do contexto, como to miss, to be homesick, to long for, etc.

Até mesmo a noção de gênero é afetada pela língua, pois uma pesquisa realizada por Lera Boroditsky, uma pesquisadora de ciências cognitivas, apontou que as crianças em Israel se conscientizavam de seu gênero um ano antes das crianças da mesma idade na Finlândia, pois o hebraico possui diversos modos de marcar o gênero nas palavras, enquanto no finlandês essa diferença é quase inexistente.

Carlos Magno, o grande imperador, já sabia disso. É atribuída a ele a frase “Conhecer uma segunda língua significa possuir uma segunda alma.” Já em 1940 o linguista Benjamin Whorf formulou a teoria de que a língua plasma o cérebro de tal maneira que duas pessoas que falam idiomas diferentes serão sempre diferentes do ponto de vista cognitivo, o que levou à Hipótese de Sapir-Whorf, ou relativismo linguístico.

A essa altura você deve estar se perguntando se não é a cultura que influencia a língua. A verdade é que as duas estão tão intimamente ligadas que é impossível criar uma teoria absoluta. O fato é que cada língua é um universo em si, e para aprender bem um idioma, é necessário conhecer não só sua gramática mas também sua cultura e estrutura, bem como a arquitetura de pensamentos que a gerou.

Fontes:

https://pt.wikipedia.org/wiki/Pirarrãs

https://www.wsj.com/articles/SB10001424052748703467304575383131592767868

https://www.corriere.it/salute/neuroscienze/16_febbraio_26/lingua-influenza-personalita-modella-cervello-95a1f04a-dc83-11e5-830b-84a2d58f9c6b.shtml?fbclid=IwAR1EaWBUgR914p3LC_4XF858CrEtijs5iff28wO-21I-LN-A9qFqZ7n2e04

 

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